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1. Sexta-Feira

(Juliano Guerra)

Eu não danço samba

Sou torto demais

Mas não desaprovo

Quem quiser dançar

Vá lá, vá ver

O céu desabar

Vão até dizer

Que esse é o mal do samba

Quando é devagar

Deixa a gente triste e só penar

Não adianta nada

Se a moça dançar

Sem nem me ver

 

Esse é o meu canto

É minha cadeira

Meu cinzeiro santo

Minha sexta-feira

Vou cantar de novo

Não é brincadeira

É minha vida toda

Êta vida boba

E viva a sexta-feira

 

O sonho é vão

Mas a gente espera

E vira uma fera

Se ele não vingar

E daí, se mais um se entortou

E caiu?

Eu vou rir

 

O bloco passou

A banda já era

E haja primavera

Pra recomeçar

E ver a moça dançar

E aí, quem sabe

Me olhar

2. Um Hino

(Juliano Guerra)

Eu rabisquei teu nome num papel

E arrisquei quaisquer palavras vis

E até meu violão se surpreendeu

Das notas carinhosas que eu fiz

 

E quis compor pra ti essa canção

Como se fosse um hino e tu país

Que eu fiz erguer no mar do coração

E que não se dissolve por um triz

 

E quis reconhecer

Em cada gesto vago e arredio

O meu amor

E no meu beijo frio, revoluções

E assim me fiz teu ditador

 

E fui nuvem escura no teu céu

E naufraguei teus sonhos e navios

E te esculpi com o verbo por cinzel

E te afoguei num mar de desvarios

 

 

 

 

 

E quis te surpreender

A cada pobre acorde que saiu

Ao violão

Em cada verso vago que cantei

Alimentei essa ilusão

 

Então cantei nos bares nosso caso

O acaso que te fez minha mulher

E me inclinei depois de cada aplauso

Como um velho cantor de cabaré

3. Sonhando Violões

(Juliano Guerra)

Sonhando violões

Chorando em botequins

Sempre as mesmas canções

Quem sabe eu possa enfim

Mudar esses refrões

Quem sabe um tom menor

Quem sabe um Tom Jobim

Que eu já sei de cor

E decorei por ti

Pra te encher de dó

 

 

Vivendo a ilusão

Que o teu querer criou

Mentindo na canção

Mil ideais de amor

Um barco a tua paixão

Meu peito um temporal

Sob esse cobertor

Um céu de viração

Se apronta pra chover

A minha indecisão

4. Biografia

(Juliano Guerra)

Fizeste de nós

Um casal de romance

E do nosso romance

Uma biografia

E eu queria tanto

Ser esse teu santo

Amante

Um Valmont galante

Herói de romance

Que morre no fim

 

E nessa tua pantomima

Eu perdi o rumo

E teu sonho desbotou

Quem dera eu fosse indecente

O suficiente

Para ser o teu Rimbaud

Teu poeta mal du siècle

O teu Miller gigolô

 

Fizeste de nós

Uma atroz fantasia

Uma alegoria

Que eu quis confirmar

Quiseste quimeras

Mentiras sinceras

Traições e abusos

Quiseste sussurros

E encontros obscuros

Tudo ao som de um blues

 

O teu amor descrente

Fez meu samba dolente

Ficar inda mais triste

Viu, meu amor?

Esse céu, esse som

Nosso final é certo

E eu fitando o concreto

Sem dizer o que quero

Fica o meu peito aberto

E te vejo partir

5. Tanta Novela

(Juliano Guerra)

Quando eu te vi fechando a porta

E encenando o mesmo ato

Eu tinha a mesma vergonha

Usava o mesmo sapato

Éramos nós dois os mesmos

Da tal cama pequenina

Tu flor rara, toxina

Eu o morto anunciado

 

E o tempo parado ali

Dentro das tuas janelas

Quando quis até fingir

Que já não eras tão bela

Mas logo olhavas pra mim

Com teu olhar obscuro

Em que eu vi tanto futuro

Inventei tanta novela

 

Quando eu procurei, desesperado

Algo meu do teu agrado

Palavras-chave complexas

Pra abrir teu peito trancado

E deixar entrar pelas frestas

De uma persiana escura

Um facho da tal doçura

Que tu tinhas no passado

 

E o tempo parado a rir

E já tu eras a janela

Da qual olhava pra mim

E ainda eras tão bela

Mas logo punhas um fim

No teu olhar obscuro

Em que eu vi tanto futuro

Inventei tanta novela

 

Quando ao fim da tarde

Eu vi o tédio

Empoçar tua retina

Tu não eras mais menina

Eu não era mais poeta

Não havia mais remédio

Te dei adeus apressado

Disseste “toma cuidado”

E a porta já estava aberta

6. Logo Vem

(Juliano Guerra)

A vida é muito rock’n’roll

Às vezes

Viu, menina?

É sina de quem tem

Chaga no peito pra virar

Ferida não cicatriza

Avisa que logo vem

Tua vitória e vem valor na esquina

E vem propina

E vem taxa em cima

Vem

 

Joga o teu corpo pro céu

Sorte de quem te aparar

Alguém que compre esse anel

Que o outro não quis comprar

Alguém que desfaça o véu

Que deixa o ventre gritar

Alguém que saiba querer

Alguém que queira te amar

 

 

 

 

E a vida é cheia de caô

Revezes

Viu? Às vezes

Melhor nem se importar

Matar no peito

E continuar na lida

Viu, querida?

É um jeito de ganhar

 

Joga teu corpo pro céu

Sorte de quem te aparar

Alguém que compre esse anel

Que o outro não quis comprar

Alguém que rasgue esse véu

Que deixa o ventre gritar

Alguém que saiba querer

Alguém que queira te amar

7. Vi Vir Veio

(Juliano Guerra)

Foi fatal

A gente se encantar assim

Por essa cor vulgar, marfim

E nunca mais parar de andar

Perdidos pelos botequins

Tal qual santos em procissão

Querendo alguém pra amar

E ao fim

O alguém dizendo não

 

E foi legal

Que o anjo vindo da FEBEM

Com a boca torta disse “amém”

E nos abençoou, jurou

Que o bem havia de chegar

Pra nos livrar da obsessão

De sempre ver o sol raiar

Mascando essa ilusão

 

Sonho que eu não vi vir

Quando eu vi, veio

Em pleno primeiro de abril

Fogo que eu não quis ter

Rasgou teu seio

Certeiro como um fuzil

 

Eu fui tão boçal

Que até samba canção eu fiz

Praquela mulher infeliz

Que nunca quis saber de mim

E foi assim

Que o anjo vindo da FEBEM

Com a boca mole disse “amém”

Nos amaldiçoou, berrou

 

Sonho que eu não vi vir

Quando eu vi, veio

Em pleno primeiro de abril

Fogo que eu não quis ter

Rasgou teu seio

Certeiro como um fuzil

8. 20 Cigarros Por Dia

(Juliano Guerra)

Quando eu acordo

Eu sento na beira da porta

Fico olhando a rua morta

Não vem ninguém me acudir

O jornaleiro

Me joga as novas do dia

Mas é tanta porcaria

Que eu prefiro dormir

Olho pro mundo

Já outro coitado nasce

Outro nome, outra face

Pra juntar com a multidão

Eu ando aflito

Com o tamanho dessa joça

Porque assim não há quem possa

Crer ainda em salvação

 

Vinte cigarros por dia

E macumba pra turista ver

Muito pouco de alegria

E quase nada de prazer

 

Ando tentando disfarçar

Minha tristeza

Cada vez que eu sento a mesa

Com a prece por fazer

Pai, dai-nos hoje

O pão nosso de cada dia

Mas também a alegria

Que teimou em se esconder

Nossa senhora

Mãe de todos pecadores

Nossa Senhora das Dores

Quantas mais santas houver

São tantas, tantas

Que eu até perdi as contas

Duma delas gostei tanto

Que até fiz minha mulher

 

Mas hoje ela caiu no samba

Faz macumba pra turista ver

Ela posa pra revistas

Faz programas de TV

 

20 cigarros por dia

E remédios pra gente esquecer

Que não há mais alegria

E quase nada dá prazer

9. 1983

(Juliano Guerra)

Os meus amigos de infância

Já tem carros, já tem contas

Têm vizinhos, têm crianças

Eles têm a mesma ânsia

Meus amigos têm amantes

Ao invés de namoradas

E ao invés dos bares torpes

Pelas tortas madrugadas

Eles têm seus restaurantes

Medo de voltar pra casa

 

Os meus amigos de infância

Pés no chão, a vida feita

Respiração rarefeita

De rotina e de absurdo

E eles têm seu conteúdo

E eles têm sua atitude

Teimam com a vicissitude

De ter sempre nada e tudo

 

Os meus amigos de infância

São exemplos de saúde

Mas vão morrendo amiúde

Do tédio que não se malha

E eles temem a mesma falha

E andam na mesma navalha

E eles têm a mesma tara

Que é ter sempre tudo e nada

 

Meus amigos têm amantes

Ao invés de namoradas

E ao invés dos bares torpes

Pelas tortas madrugadas

Eles têm seus restaurantes

Medo de voltar pra casa

10. De Improviso

(Juliano Guerra)

Foi de ouvido

Que eu aprendi a cantar

De improviso

Feito uma folha solta no ar

E se desafinar é o bom

O melhor é errar e de vez

Levar a vida num semitom

E assim me consolei

Quis tão pouco

Ou quase nada

E na fé, fiz morada

Eu esperava só pra ver

Se há alguém por nós

Por aí

E onde fica esse tal lugar

Se a minha voz ressoa até lá

E assim eu me perdi

 

 

É distraído

Agora o meu caminhar

Os pés, tão perdidos

Já não encontram mais seu lugar

E foi num dos tropeços que achei

Os braços que hão de me consolar

Tentei prever quem vinha de lá

E assim eu me enganei

Sobre o sentido

E a direção a tomar

Quis ver

Um tal perigo

Ajoelhado ao pé de um altar

Tua manobra eu quis desvendar

Adivinhei as voltas e assim

Aos poucos pude me aproximar

E em ti eu me achei

 

Conte comigo

Pra te guardar

De todo mal

Conte comigo

Ou me ajude a contar

Eu não sei mais

Conte comigo

Pra te guardar

De todo mal

Conte comigo

E se deixe levar

Ao deus dará